domingo, 7 de julho de 2013

Chico Xavier e O PERDÃO


A reunião do sábado, dia 26.03.83, trouxe-nos aos comentários o Cap. X, no seu item 14 — "Perdão das ofensas". Estávamos na semana que antecede o natalício do nosso querido Chico... 
No dia 2 de abril ele completaria, como o fez, 73 anos de abençoada existência.

Como de praxe, vários amigos falaram sobre o tema da tarde. 
Digno de nota o que ocorreu, enquanto estudávamos a questão do perdão: um cão de pelos negros passeava, despreocupadamente, por entre as pernas dos companheiros assentados nos bancos... Ele até cheirava mal. Por certo teria rolado nos restos orgânicos de algum outro animal morto, e trazia as patas sujas de lama... 
Incomodados, alguns batiam levemente com o pé no animal, tentando afastá-lo, até que alguém agarrou-o pelos pelos... Ele ganiu muito.

 Para nossa surpresa, porém, o Chico pediu que lhe pusessem o cachorro no colo... E, sem se importar com a roupa que sujava, ele permaneceu boa parte do culto acariciando aquele vira-lata, sussurando aos seus ouvidos palavras de carinho... A lição foi grandiosa, e, depois que a reunião se encerrou, muitos estavam alisando o animal... Bem, vamos reproduzir agora o comentário de Chico sobre o tema do perdão.

"Estou ouvindo o nosso Emmanuel que nos pede um minuto de consideração em torno dos recursos da nossa inteligência, porque, naturalmente, a Providência Divina nos permitiu a lucidez de que dispomos para podermos discernir tudo aquilo que seja o bem ou o mal.

"A Natureza em que vivemos, e da qual dependemos diariamente, é um reino em que o Senhor nos situou, para que desfrutássemos de todas as vantagens que Ele nos pudesse oferecer em benefício da nossa vivência e sobrevivência no Planeta. 

"Quantas vezes somos perdoados pelos animais?...

"Se as nossas vacas pudessem fazer um sindicato e levar à justiça um requerimento para que não sejam tão maltratadas, tão esgotadas... Se, por exemplo, as árvores frutíferas, não nos perdoassem a agressividade exagerada não teríamos a nossa mesa tão rica para a para a refeição de cada dia.

"A Natureza é também a face do perdão de Deus para conosco.

"Quando falamos em perdão, sempre nos colocamos na posição do benfeitor que está apto a perdoar; no entanto, somos tolerados diariamente pela Providência Divina...

"Nós, por exemplo, engordamos o suíno. Quem vê o cuidado de uma pessoa engordar um suíno, supõe, naturalmente, que a pessoa esta pensando no conforto do animal...

"Criamos as galinhas, e, quando queremos aproveitar da carne, as chamamos com muita ternura:

 — Vem cá, nega... E quando ela se aproxima passamos a faca no seu pescoço...

"Quando chega o Natal, tempo de honrarmos a Nosso Senhor Jesus Cristo, é o tempo — existem pesquisadores escutando a comunicação com as árvores, os animais — em que a matança é imensa; escolhemos a classe dos perus. Se eles pudessem, corriam de nós mil léguas, quando falássemos o nome de Jesus... 

"Somos perdoados diariamente...
"Ninguém vai deixar de se alimentar... A pecuária vai imperar ainda por muitos séculos. Referimo-nos ao excesso. Se dois frangos bastam por que matar vinte? Se já temos a carne dos perus, por que querer a do bovino, a do porco, a da perdiz? Referimo-nos ao excesso, porque o excesso nos vicia, criando problemas sérios para a saúde.

"Devíamos fazer uma certa poupança dos recursos com que a Mãe Natureza nos socorre — se lhe acabarmos com todos os recursos, ficamos desvalidos...

"Tantos cientistas se preocuparam com esse assunto, que criaram a ciência ecológica; é um nome bonito, mas podiam simplificar mais.

Amor à Natureza, amor a uma árvore, a um muar...

"A palavra ecologia é muito bela, mas é uma palavra pouco acessível para nós. Os cientistas nos poderiam ensinar o amor à Natureza. Nós não sentimos afinidade com a palavra, os cientistas nos poderiam ajudar... Amor à Natureza, aos animais, proteção para com outros reinos inferiores...

"Encontramos tantos exemplos de bondade, de compreensão, de auxílio no campo dos animais, das árvores, que esse termo — reinos inferiores — é pouco simpático... Não vemos inferioridade no cão que nos ajuda a exercer vigilância na nossa casa, nas vacas que nos fornecem leite como se fossem nossas empregadas... 
Às vezes, extraímos o leite da vaca, amarrando-lhe o filho à perna... Trabalhei 35 anos no Ministério da Agricultura; lidei com ovelhas, cabras, muares, cavalos, vacas, touros... Eu vi muita coisa. Não podemos classificar essas criaturas como sendo inferiores... Estão no estágio evolutivo que, lhes é próprio...

"É muito interessante que observemos tudo isso.

"Agora é uma observação minha, pessoal. Eu trabalhei numa repartição em que o chefe era um homem boníssimo; ele experimenta a boa vontade, a assiduidade, a disciplinada do funcionário, dando-lhe condução para a sua própria residência, depois que esse funcionário trabalhasse por doze anos... Para que eu tivesse acesso à uma charrete, trabalhei, portanto, doze anos... Era considerado um prêmio. Mas, na charrete que eu ia também o almoxarife da repartição. O almoxarife era uma pessoa preparada, um bom companheiro mais na charrete cabiam apenas duas pessoas. Eu não aprendi a guiar, não aprendi a guiar nem mesmo a mim próprio... Ele é quem guiava a charrete. O burro que nos auxiliava chamava-se Maquinista. O Maquinista andava devagar. Para que o Maquinista andasse depressa tinha que ser ferido no traseiro, e também para o chefe não ver, pois ele não gostava que se maltratasse os animais. O almoxarife construiu uma espécie de ferrão, para que o Maquinista andasse depressa. 

Meu chefe dizia:

 — Engraçado, com esse funcionário, o burro é sempre esperto, ativo...

"Se o animal não corresse, ele fazia uma ferroada debaixo da cauda, às vezes fazia até sair um pouquinho de sangue...

"Durante seis anos com a charrete eu vi isto sem poder dizer nada, pois ele era um chefe intermediário...
Às vezes, escondido, passava uma pomada no lugar.
 Se eu denunciasse... ele era pai de família... 
Depois, ele pediu transferência para os Correios, de Belo Horizonte. 

No dia da despedida, o Maquinista ainda nos levou. Quando voltamos, o burro, muito suado, cansado, trouxe o nosso chefe.

 Este, então, disse: 

— Maquinista, ficamos sem a companhia de fulano de tal, que pena, não é, Maquinista?... 
Mas, você trabalhou, está com a consciência tranquila, não é mesmo, Maquinista?

"Eu nunca havia visto um burro rir como um jumento.
E ele o fez: Ah! ah! ah! ah!... umas quarenta vezes"!

"Meu chefe me falou: 

— Aquela risada daquele burro me impressionou: você não acha alguma coisa?

"— Eu não posso saber, eu sou um servidor — respondi.

"Mas havia um companheiro que contou:

 — Levante a cauda do Maquinista que o senhor vai ver.

"Tinha aquelas cicatrizes enormes.

"Meu chefe, então, mandou aposentar o burro, dois anos no pasto sem trabalhar para ninguém... 

Ele nos perdoava, aguentava tudo aquilo, não podia denunciar... 

O negócio de aguentar calado não é só conosco, não ."

Cremos que qualquer comentário seja desnecessário. 
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Chico Xavier, à Sombra do Abacateiro (Carlos A. Bacelli)

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